terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

Mais um sonho.


Um passarinho assovia de um modo repetitivo do lado de fora da janela, enquanto eu batuco com os dedos sobre a mesa.

Mordo meu lábio inferior, nervoso. Percebo que não consigo escrever.

Já faz quase um mês… essa abstinência começa realmente a me perturbar. Continuo a espremer meu cérebro. Chega a doer. Nada. 

Levanto, dou alguns passos sem rumo e com raiva atinjo a parede com um soco. Idiota de minha parte, já que a maior prejudicada com o golpe foi a minha mão congelada de frio.

Depois de resmungar como um velho, desço as escadas, pego meu casaco e saio de casa. Ficar trancado respirando o mesmo ar já usado por mim tantas vezes não me ajudaria em nada.

Meus chinelos não são exatamente a melhor escolha pro tempo glacial que encontro fora de minha casa, mas a última coisa que considero é a ideia de voltar apenas para trocar-los.

A rua de paralelepípedos, irregular, encontra-se molhada, e por vez meus pés quase se atropelam e chego perto de cair. Duas crianças, antes brincando, riem baixo, sarreando.

Depois de continuar andando por quase meia hora, chego ao meu destino.

A curta praia se abre à minha frente, o dia opaco deixando-a deserta, exceto por dois pássaros idênticos aos que sempre estão à beira da janela da minha saleta.

Tiro meu casaco, jogando-o na areia, e um arrepio violento me sobe a espinha. Então, tiro meus chinelos, pisando na areia gélida.

Começo a caminhar.

Aos poucos, vou perdendo a sensibilidade nos dedos, e então nos pés inteiros. Vou chegando mais perto do mar, e minha pele rígida de frio começa a se amortecer

Minha calça jeans e minha camiseta fina começam a ficar cada vez mais e mais frias. Minha temperatura corporal vai gradativamente diminuindo.

Paro por um segundo, e olho pra baixo. Sinto um pouco de cócegas no meu pé esquerdo… com dificuldade, vejo que acabei de pisar em um caco de vidro, e há um corte em minha pele pálida. O corte está úmido de um sangue vermelho vivo, que mancha a areia clara.

Pego o caco de vidro em minhas mãos, mal sentindo-o. É um pedaço de espelho. Com um tamanho suficiente apenas para ver o reflexo castanho claro de um dos meus olhos nele. O reflexo é manchado. Uma mancha de sangue já seco.

Coloco o caco ensanguentado no bolso, e me volto para meu pé levemente ferido. Toco no corte, não sentindo dor. Olho por alguns longos segundos para os meus dedos molhados do vinho de meu corpo. 

Parece extremamente quente contra minha pele anestesiada.

Olho para o mar escuro… para as águas gélidas e a promessa de paz. 

Meus pés tomam o rumo do atlântico.

Começo a correr em direção ao fim.